Ele, o pai, corta uma fatia de pão. Ele, o filho, também.
Os dois servem-se de uma xícara generosa de café. O pai não adoça, adiciona leite. O filho, ainda está refém do açúcar.
Sentam-se à mesa, um de frente para o outro. Ele, de óculos escuros e o pai, bem, o pai usa os óculos de grau.
Eles se servem de pão, queijo, presunto e silêncio.
Não há necessidade de dizer uma palavra. Silêncio.
O pai termina o café, ele, entre as mordidas naquele pão árido, chora e tenta esconder as lágrimas atrás daqueles óculos escuros. Droga! Elas escapam.
As bochechas estão úmidas. Ele, o pai, se distrai. Ele, o filho, as enxuga rapidamente.
Ele, o pai, levanta. Terminou o ritual matinal, sem ignorar ele, o filho.
Ele, o pai, deixou o filho viver o momento dele. Em silêncio, entendeu que ele, o filho, queria ficar quieto.
Ele, o filho, usa de artifícios destilados para se permitir sentir.
Eles, os amigos e a família, devem achar que ele é apenas um embriagado.
Ele, o filho, permite-se usar da única droga que ele pode controlar, em medidas, o quanto pode se permitir sentir. Pois uma vez sóbrio, ele é rocha.
Hoje, data solene, dia ridículo que ele quis esquecer. Hoje, o dia grita, seja por ser dezembro, seja por ser apenas aquele ridículo número 12.
Hoje, ele quis tanto falar e não conseguiu. Hoje, ele preferiu ficar em silêncio.